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À igreja em Laodicéia,
3.14-22
14 Ao anjo (cf.
nota 179) da igreja em Laodicéia (cf. nota 180) escreve: Estas coisas
diz o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus:
15 Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente.
Quem dera fosses frio ou quente!
16 Assim, porque és morno e nem és quente nem frio, estou
a ponto de vomitar-te da minha boca;
17 pois dizes: Estou rico e abastado e não preciso de
coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu.
18 Aconselho-te que de mim compres ouro refinado pelo
fogo para te enriqueceres, vestiduras brancas para te vestires, a fim de que
não seja manifesta a vergonha da tua nudez, e colírio para ungires os olhos, a
fim de que vejas.
19 Eu repreendo e disciplino a quantos amo. Sê, pois,
zeloso e arrepende-te.
20 Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha
voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele, comigo.
21 Ao vencedor, dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono,
assim como também eu venci e me sentei com meu Pai no seu trono.
22 Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às
igrejas.
14 Sobre a indicação dos destinatários e a ordem para
escrever, cf. EXCURSO 1a, sobre a
auto-apresentação, cf. EXCURSO 1b. Estas
coisas diz o Amém. Em 2Co 1.20 ainda se formula de maneira gramaticalmente
correta: ―Cristo é o Amém [neutro]‖. Aqui, porém, consta uma abreviação
lapidar: o Amém ([masculino] a saber: aquele que se chama ou é Amém). Ponto de
partida talvez seja Is 65.16. Deus não apenas jura, Ele próprio é um
juramento. Entre Ele e Sua Palavra simplesmente não se pode meter nenhuma
cunha, porque nEle não existe um ―entre‖. Seu dizer e ser apóiam-se um sobre o
outro e são a mesma coisa. Esse Deus, pois, mostra sua face em Jesus. Quem vê
Jesus, consegue contemplar o Amém, ouvir seu juramento, experimentar sua
fidelidade.
Esse Senhor depara-se com uma
igreja que é totalmente igreja por aparência. Também em outras igrejas ocorrem
abismos entre aparência e verdadeiro ser. Aqui, porém, o acusado ainda
interrompe presunçosamente para se justificar (v. 17): ―Tenho tudo, não me
falta nada‖. Por meio dessa glorificação própria, Laodicéia chega a uma
perigosa vizinhança com a Babilônia (Ap 18.7). Sob essas condições, o que seria
o testemunho cristão senão mera enxurrada de palavras? Incide, portanto, no
âmago dessa verborréia a palavra, o juramento, o Amém.
A testemunha fiel e
verdadeira. A ―testemunha fiel‖,
reforçada por ―verdadeira‖ (cf. nota 230) deve ser interpretada conforme Ap
1.5, a saber, na sua relação com a Sexta-Feira da Paixão. O Amém que Ele
concretiza, o juramento que Seu amor jura, foram selados pelo seu sangue. Todo
discurso de Deus em Cristo é consistente em si e aproxima-se dessa igreja morna
como eternamente confiável, como fidelidade pura e como amor ardente. Será que
esse braseiro poderá incendiar-se em Laodicéia?
A auto-apresentação encerra-se
com as palavras: o princípio da criação. De acordo com Cl 1.18 e,
sobretudo, com Ap 1.5, é recomendável que essa formulação remeta à Páscoa
enquanto fundação do novo mundo. Conseqüentemente, todas as designações possuem
profundidade cristológica. Fala-se de Sexta-Feira da Paixão e Páscoa, e o
oráculo do vencedor no v. 21 fala da Ascensão. A proclamação dos grandes feitos
de Deus emoldura, portanto, a mensagem a Laodicéia.
É evidente que isso acontece
intencionalmente diante de uma igreja para a qual nada é tão necessário quanto
ser novamente evangelizada. Essa missiva distingue-se das demais pelo fato de
que fala incessantemente de Cristo e o aproxima em renovadas formulações da
situação da igreja (cf. o comentário sobre os ditos de gravação), pressupondo
pouco e não abordando nenhuma correlação bíblica mais profunda. Em
contrapartida, refere-se de modo especialmente nítido à situação da igreja. Não
é por acaso que evangelistas preferem esse texto.
15 O inquérito judicial (EXCURSO 1c) trata essa igreja como um bloco único. Não há os
―demais‖ (Ap 2.24) ou ―alguns‖ (Ap 3.4 [BLH]) que se mantêm fiéis. Conheço as tuas obras, que
nem és frio nem quente. Água fervente ou fria tem utilidade. Contudo, a
quem fortaleceria ou refrescaria água morna? Nessa passagem, ela está sendo
oferecida a Cristo, pois ele a degusta em sua boca (v. 16). Ela o repugna. Ele
é hóspede em Laodicéia e, com a maior tranqüilidade, os anfitriões servem-lhe
água morna. Servem-no com seu serviço lerdo, com seus cultos sonolentos, com
orações de ladainhas e com seu cuidado pastoral negligente. Conheço, diz
o Senhor diante dessa atividade. Obviamente ele o sabe, pois ele tem de
experimentá-lo. Toda a mornidão na comunidade, toda atitude lerda e desligada,
também diante das pessoas, fere a ele. O que é feito a um de seus mais
humildes irmãos, é praticado contra ele.
Não somente Cristo, também
Satanás conhece a maré espiritual baixa da comunidade (cf. o comentário a Ap
3.1). Por isso ele os deixa integralmente em paz. Por isso não se informa nada
sobre tentação e perseguição, negação, apostasia ou abalos. Tudo está intacto e
tudo se realiza. O quadro de membros não dá razão para preocupações. Sim, os
membros mornos consideram o Senhor Jesus Cristo tão inócuo, que nem sequer se
desligam.
Quem dera fosses frio ou
quente! Essa exclamação denota uma
avaliação definida. O grau mais alto é ―quente‖, p. ex., nos termos de Rm
12.11: ―sede fervorosos de espírito‖. Depois segue-se na escala de valores a
rejeição clara e fria. No nível mais baixo, porém, está a mornidão. É nele que
se abafa de modo suave, mas determinado, o ardor e rugir do Espírito,
evitando-se de toda forma ser um adversário. Normalmente, esse caminho
intermediário entre os extremos é considerado o ―equilíbrio áureo‖. Contudo, o
cristão ―nem a favor nem contra‖ na verdade não se encontra no meio, mas sim em
queda livre, no ponto mais baixo da escala de valores.
Entre a acusação e a palavra de
ameaça (EXCURSO 1d)
normalmente encontra-se o chamado ao arrependimento. Na presente missiva,
porém, precipita-se uma ira tão incandescida sobre a situação da comunidade que
a ameaça é acrescentada no mesmo fôlego. Isso não significa que não seja mais
possível o arrependimento, pois mais adiante segue-se o convite para ele. Antes
significa que diante da igreja amornada não se apresenta nenhum Senhor morno.
Seu ardor é esperança para todos os mornos.
16 Assim, porque és morno e
nem és quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da minha boca. Com vistas a quatro igrejas o Senhor dissera: ―Tenho
algo contra ti!‖ Agora é declarado: ―Tu me repugnas!‖ Esse é o ápice da
condenação. Ainda assim – ele ainda suporta os insuportáveis por algum tempo.
Justamente nesse ponto segue-se uma palavra de arrependimento extraordinária (EXCURSO 1d), um lutar e requestar por Laodicéia.
17 Agora a igreja toma a palavra, revelando uma
arrasadora ignorância diante do conhecimento de seu Senhor no v. 15: pois
dizes: Estou rico e abastado. Foi assim que falou em outra ocasião o rico
fazendeiro em Lc 12.19. No presente texto fala um comerciante rico. ―Sim‖,
pondera ele, ―tornei-me rico‖. Conhecemos a opinião das pessoas bem-sucedidas,
como se refestelam em suas recordações sobre como levantaram seus negócios. No
passado assumiram um pequeno comércio, agora possuem uma gigantesca loja de
departamentos! A conclusão talvez soe como Zc 11.5: ―Não o consideram pecado
algum, e dizem: louvado seja Deus, agora sou rico!‖ (tradução do autor). Da
mesma maneira acontece aqui, que a gabolice com o sucesso material transita
para a presunção de uma posse religiosa. N縊 preciso de
coisa alguma. Em 1Co 12.21 essa
formulação ocorre em relação a outro membro da igreja: o irmão não tem nada de
significativo para me oferecer. O que ele fala não é importante. Comigo mesmo
tenho o suficiente. No presente texto, porém, o orgulho do que providencia tudo
por si mesmo levanta-se diante do próprio Senhor. Jo 15.5 é virado de pernas
para o ar: ―Sem ti podemos realizar tudo!‖ É assustador formulá-lo dessa
maneira, mas quantas vezes isso é praticado na vida (1Co 4.8)! Nessa
auto-suficiência diante de Jesus, nesse afastamento do trono de sua graça
residem o pecado originário da igreja, bem como o começo do fim.
Entretanto, nem mesmo Sansão
notou que sua força o abandonara: e nem sabes que tu és infeliz, sim,
miserável (―e nem sabes que és miserável e digno de pena‖ [tradução do
autor]). É assim que se apresenta o quadro da realidade do homem ativo nos
negócios e conformado com o mundo, que acompanha tudo. Ele está tenso e
desgastado, o tipo de atribulado de Mt 11.28 (o mesmo vocábulo em Rm 7.24). Ele
deveria chegar a Jesus, porém não o sabe. Ele se considera independente: ―Não
careço de nada‖. Contudo, tem necessidade dos remédios e da cura para o
coração. Toda vez que alcança o sossego, busca o divertimento e os
compromissos, saindo logo de novo às pressas. Sobretudo teria necessidade da
compaixão e, finalmente, do arrependimento. E por estar tão sobrecarregado, é
digno de pena. A ira não torna Jesus cego para o pecador. Ele preserva o olhar
pela pobre criatura. Ela lhe dá pena, e muito mais quando ela mesma não tem
consciência de si, mas ainda se auto-engrandece. O estado espiritual é
caracterizado com três ilustrações: pobre, cego e nu (cf. abaixo).
18 A esses três pontos enfermos correspondem os três
conselhos. Aconselho-te. Talvez haja aqui uma conotação do linguajar
comercial. Jesus se apresenta como comerciante (Mt 13.45), oferecendo três
especialidades de Laodicéia famosas naquele tempo. Pelo que se evidencia, a igreja
entrementes misturou-se intimamente com o mundo que a envolve. Enquanto antes
constituía um templo de Deus nessa cidade de lojas, agora ela própria se tornou
um estabelecimento comercial (Jo 2.16), estando acomodada ao seu contexto. O
espírito de negócios, de compra e de regateio, havia deslocado o Espírito
Santo. Por amor à igreja, porém, Jesus se transforma num mercador, que tenta
superar todos os seus concorrentes: ―de mim compres, com toda a certeza
receberás boa mercadoria‖. Com tenacidade, quase como de um mascate, ele
oferece ora isso, ora aquilo, sempre apresentando ao freguês reticente novas
mercadorias. O Filho Eterno se rebaixa a um ponto tão humilde. Fez-se um
laodicense para os laodicenses, a fim de conquistá-los.
Com o que Laodicéia deverá
pagar? Seguramente essa resposta teria de ser respondida com Is 55.1: ―Ah!
Todos vós, os que tendes sede, vinde às águas; e vós, os que não tendes
dinheiro, vinde, comprai e comei; sim, vinde e comprai, sem dinheiro e sem
preço, vinho e leite‖ Também Ap 22.17 conhece essa curiosa ―aquisição‖. Com
certeza reside nisso um indício dos altos ―preços‖ que o ser humano paga nesse
mundo por artigos de pouco valor, comprometendo pureza, honra, paz e saúde.
Junto desse novo ―comerciante‖ na verdade se comprará com vantagens, sim, de
forma extraordinariamente vantajosa, a saber, de graça. Ele começa com suas
ofertas:
De mim compres ouro refinado
pelo fogo para te enriqueceres. O
ouro dos bancos de Laodicéia tinha boa fama por causa da consistência de seu
valor (cf. nota 243). Ao adquiri-lo, o freguês estava bem atendido. Contudo o
mercador adverte: ―Todos vocês que se abasteceram do ouro de Laodicéia, são
pobres e terrivelmente enganados. Façam rapidamente negócios comigo e tornem-se
verdadeiramente ricos.‖ Nesse texto, ―ouro‖ é expressão da verdadeira posse.
Todas as missivas às igrejas falaram sobre ter e não ter (nota 185). Cristo faz
o balanço. Ele encontra prateleiras totalmente vazias. Contudo, ainda há tempo.
Ele quer ajudar a igreja a passar do passivo para o disponível, ou seja, para
que tenha amor, fé, serviço, testemunho, esperança (cf. 1Pe 1.7,18; 1Co 12,13).
Vestiduras brancas para te
vestires, a fim de que não seja manifesta a vergonha da tua nudez. Laodicéia possuía uma indústria têxtil produtiva, sobretudo
para tecidos pretos, da moda (cf. nota 243) – Diz-se que os acusados
compareciam de preto diante do tribunal. Os condenados eram despidos (aqui, no
v. 17; também Jesus foi despido antes da crucificação), réus absolvidos
recebiam uma veste branca (cf. o comentário a Ap 3.4). São essas as correlações
do nosso texto. O Senhor não deseja a nudez de sua igreja. Ele lhe oferece
purificação e absolvição.
E colírio (―pomada‖) para ungires os olhos, a fim de que
vejas. No Oriente as doenças nos olhos eram muito freqüentes, causadas pela
forte irradiação solar, por constante poeira, exigüidade da água e falta geral
de higiene. Por isso havia muitos cegos, muitos médicos de olhos e centenas de
diferentes remédios na forma de pomadas, talcos e gotas. Também Laodicéia
comercializava uma famosa marca desses produtos (cf. nota 243).
Quando o v. 17 chama a igreja
de cega, sintetiza-se toda a miséria. Muitas vezes os cegos são pobres, e os
pobres andam precariamente vestidos. A causa da pobreza e nudez reside na cegueira.
A cegueira espiritual, da qual o AT fala com tanta freqüência, refere-se ao direito de
Deus de fazer reivindicações, às conseqüências da desobediência, bem como à
subestimação do pecado e de Satanás. De acordo com Jo 9.41 essa cegueira
espiritual acomete aquele que a nega. Imaginemos uma pessoa cega que se porta
como se pudesse ver, não permitindo que seja conduzida, nem tateando
cautelosamente no seu caminho. ―Não preciso de ninguém, sei fazer tudo
sozinho!‖ É essa a desastrosa cegueira que se apresenta no presente texto (v.
17).
Foi por isso que o grande
médico de olhos diagnosticou primeiro: ―Estás cego!‖ e agora declara: ―Vendo
para ti pomada para os olhos!‖
19 Nesse instante o Senhor tira a máscara do comerciante
aplicado aos negócios, revelando-se como aquele que ele é: como amigo de todas
as igrejas: Eu repreendo e disciplino a quantos amo. O amor de amigo (Jo
15.14,15, aqui no v. 20) expressa-se em duas atividades que, na formulação,
constituem uma repercussão de Pv 3.12 (e Hb 12.7), mas que novamente devem ser
examinadas no seu contexto. Lá elas estão inseridas na relação pai-filho, e
naquele contexto a disciplina é sofrer castigo. Contudo, é estranho a João
falar de Cristo como o Pai dos discípulos. Igualmente falta no trecho qualquer
vestígio de sofrimento por castigo. Por um lado, entre amigos focaliza-se a
palavra da verdade: Eu repreendo (―corrijo‖). O amigo rejeita tudo o que
não for verdade. Inexoravelmente ele examina as obras e cita de forma aberta o
que for imprestável. Segue-se a palavra da punição: Eu disciplino. Ele
ameaça com ira ardente, destroça a presunção, exige conseqüências e ordena o
arrependimento. Tudo isso se espelha na mensagem à igreja. Ela também está
entremeada da busca pela atenção, o chamado para despertar e convidar. Ainda
que não seja possível o elogio, nem por isso há falta do amor. Também na ira o
Senhor se lembra de sua misericórdia e ―não é com prazer que ele nos causa
sofrimento ou dor‖ (Lm 3.33 [BLH]).
Sê, pois, (daqui em diante) zeloso e arrepende-te. A primeira
das duas exortações está na forma verbal de continuidade. Aos anos de mornidão
(v. 16) devem seguir-se anos de zelo. Que sejam tomados do zelo de Jesus quando
purificou o templo (Jo 2.17) e que seja queimado o zelo antigo, impuro, que fez
da comunidade uma casa de comércio. Fora com o ativismo afundado no mundo, com
o regatear, acumular, trabalhar, correr e apressar-se por nada! O nome, o reino
e a vontade de Deus passam a determinar os pensamentos de forma nova.
20 Arrependimento desencadeia-se diante de Cristo, e
somente diante dele (EXCURSO 1d): Eis
que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei
em sua casa. Na Antigüidade se podia solicitar ingresso numa casa de duas
maneiras: ou se batia com uma argola metálica, ou simplesmente se chamava. Aqui
ressoam ambos, a batida e a voz, um sinal da premência da vontade. Como é que
os laodicenses ouviam a voz de Jesus? Por doença, sofrimento ou
acontecimentos históricos? Conforme Jo 10.3,27; 18.37 e sobretudo conforme as
sete exortações ―ouça!‖ nos ditos de gravação, cabe considerar o falar do
Espírito precisamente nessas mensagens às igrejas. Nelas o Senhor se
apresentava e se apresenta às suas igrejas, fazendo ressoar a sua voz.
Embora não lhe faltem chaves
(Ap 1.18; 3.7), ele deixa a abertura por conta das próprias pessoas.
Distancia-se de todos os meios violentos de penetrar no pecador, abordando-o
com o amor mais nobre. Não existem hóspedes mais distintos que ele e seu
Espírito. Diante dele pessoas se tornam novamente verdadeiros seres humanos,
responsáveis até o extremo. Por isso também são culpadas ao extremo quando
trancam esse amor do lado de fora.
Quando Jesus entra no
recinto daquele que lhe abre? Na sua segunda vinda? Em passagem alguma é
ensinado que o Senhor entra em pessoas isoladas na ocasião de sua volta. Ou
será que essa entrada sucede quando se celebra a Ceia do Senhor? Como tentamos
evidenciar pela tradução, o texto usa uma palavra muito genérica para falar de
uma refeição comunitária, que não deveria ser relacionada de imediato com a
celebração da Ceia do Senhor: e cearei com ele. Como comparação devem
ser observados versículos de João que falam da vinda do Senhor exaltado por
meio do Espírito: Jo 14.23,18; 16.7,13,22. Ele passa imediatamente por cada
porta que se abre para ele por meio do arrependimento. Lá dentro não há
necessidade de esperar pela próxima celebração da Ceia do Senhor. Sua presença
no Espírito Santo (à semelhança de Mt 28.20; 18.20) é caracterizada assim: e
cearei com ele, e ele, comigo. Talvez a inversão indique uma troca de
papéis. O hóspede torna-se anfitrião. O Jesus que entrou providencia o copo
cheio e o pão da vida. Visto que em última análise o arrependimento acontece às
suas custas, arrependermo-nos é para nós uma ―obra alegre‖ (Lutero).
21 Aquilo que até aqui caracterizou a última missiva, a
saber, a máxima culpa, o mais extremo perigo, o mais insistente chamado ao
arrependimento, o mais intenso amor, isso também se prolonga no oráculo do
vencedor (EXCURSO 1f):
novamente um ápice, a saber, uma promessa mais sublime. Ao vencedor,
dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono. O ―comigo‖ do v. 20 prolonga-se
até a consumação. ―Pai, a minha vontade é que onde eu estou, estejam também
comigo os que me deste, para que vejam a minha glória‖ (Jo 17.24). A comunhão
de mesa secreta é transformada em comunhão de trono pública. A ilustração tem
sentido por causa das amplas salas dos tronos na Antigüidade. Porém, é tão
somente uma ilustração, que tenta expressar o inexprimível. O vencedor é
acolhido numa comunhão de trono já existente anteriormente: assim como
também eu venci e me sentei com meu Pai no seu trono. A partir do cap. 5 o
leitor da Bíblia sabe a que data o Senhor está aludindo e de que espécie era
essa vitória: Ele venceu na Sexta-Feira da Paixão, quando morreu pelo mundo e
também por Laodicéia. É desde então que ele reina (cf. nota 162). Entretanto,
sua igreja ainda se encontra na luta da fé, até que também ela possa
assentar-se.
O judaísmo ensinava que no céu
ninguém além de Deus está sentado. Todos os demais estão de pé. Diante desse
pano de fundo essa promessa é intensificada de uma maneira que extrapola todas
as medidas e conceitos. O trono de Deus constitui a figura central do
Apocalipse de Ap 1.4 a 22.4. Ele é mencionado em 47 passagens. Ele é o ponto de
partida de todos os acontecimentos no céu e na terra, no mundo antigo e no
novo. Sobre esse trono, porém, Cristo ―preparou um lugar‖ (Jo 14.2) para sua
igreja em Laodicéia. Essa palavra é afirmada numa hora em que a igreja ainda é
morna. Jesus lhe oferece a última coisa que possui, sua comunhão com o Pai no
trono.
22 Quem tem ouvidos, ouça o
que o Espírito diz às igrejas. Que
diz o Espírito às igrejas através dessa última mensagem, resumidora? Ele fala
de Jesus! Jesus é o Amém [masculino], a fiel testemunha, o Primeiro da criação,
o Juiz, o purificador do templo, o comerciante, amigo, hóspede, anfitrião, o
vencedor e entronizado, e o Filho. Assim cumpre-se Jo 16.14: ―Ele me
glorificará‖, ainda que fale sobre pecado, arrependimento, juízo e salvação.
Não seria
espiritualmente correto depreender desses dois capítulos nada mais que ―Tu
deves!‖. Eles representam uma imponente nova proclamação do Senhor Jesus, para
que sua igreja não se torne uma igreja de aparências. Certamente ela própria
está sendo desmascarada nesse processo. Mas igualmente está sendo manifesto
aquele que diz: ―Eu sou‖, ―eu conheço‖, ―eu quero‖, ―eu venho, eu dou.‖